sábado, 11 de dezembro de 2010

LUZ

Luz do fogo
Aquece meu corpo
Com a Força do teu calor
Para o manter activo
No trabalho, na saúde e no rigor.

Luz
Luz da vela
Aquece e ilumina minha alma
Com a Beleza da tua chama
Para quebrar a ira e o apego que me trama
E fazer raiar a alegria, o amor e a calma.

Luz
Luz da Estrela
Ilumina o meu mental
Com a Sabedoria da tua Graça
Para abolir as fronteiras que o ego meticulosamente traça
E resplandecer a Faúlha do Uno que tudo abraça.

Jorge Moreira

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

TODO O HOMEM QUE PENSA

“Todo o homem que pensa
encontrará um dia a verdade –
pode partir de onde quiser
e ir por onde quiser.”

“Estamos sós
Com tudo o que amamos”.

“A ciência é apenas uma metade.
A outra é a fé.”

“Todas as barreiras só existem
para serem ultrapassadas
- e assim por diante.”

Novalis

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

SER POETA

Ser poeta é ser mais alto, é ser maior
Do que os homens! Morder como quem beija!
É ser mendigo e dar como quem seja
Rei do Reino de Áquem e de Além Dor!


É ter de mil desejos o esplendor
E não saber sequer que se deseja!
É ter cá dentro um astro que flameja,
É ter garras e asas de condor!


É ter fome, é ter sede de Infinito!
Por elmo, as manhãs de oiro e de cetim...
É condensar o mundo num só grito!


E é amar-te, assim, perdidamente...
É seres alma, e sangue, e vida em mim
E dizê-lo cantando a toda a gente!

Florbela Espanca

(Poema escolhido por Isabel Tavares)

sábado, 11 de setembro de 2010

MUDAM-SE OS TEMPOS, MUDAM-SE AS VONTADES

Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades,
Muda-se o ser, muda-se a confiança;
Todo o mundo é composto de mudança,
Tomando sempre novas qualidades.

Continuamente vemos novidades,
Diferentes em tudo da esperança;
Do mal ficam as mágoas na lembrança,
E do bem, se algum houve, as saudades.

O tempo cobre o chão de verde manto,
Que já coberto foi de neve fria,
E em mim converte em choro o doce canto.

E, afora este mudar-se cada dia,
Outra mudança faz de mor espanto:
Que não se muda já como soía.

Luís de Camões

quarta-feira, 11 de agosto de 2010

CÂNTICO DA ESPERANÇA

Não peça eu nunca
para me ver livre de perigos,
mas coragem para afrontá-los.

Não queira eu
que se apaguem as minhas dores,
mas que saiba dominá-las
no meu coração.

Não procure eu amigos
no campo da batalha da vida,
mas ter forças dentro de mim.

Não deseje eu ansiosamente
ser salvo,
mas ter esperança
para conquistar pacientemente
a minha liberdade.

Não seja eu tão cobarde, Senhor,
que deseje a tua misericórdia
no meu triunfo,
mas apertar a tua mão
no meu fracasso!

Rabindranath Tagore

(Poema escolhido por Carla Cazeiro)

domingo, 11 de julho de 2010

NÃO PROCURES DEUS FORA DE TI

Não procures Deus fora de ti
no seu espaço infinito
Não tentes ascender ao céu
no esforço de saíres de ti
na tua condição
Não queiras ser mais do que o abandono
de um abandonado
Não cedas à tua vontade
de querer de poder de ser ou de não ser
não aceites nada que não seja o nada
deixa-te cair até ao fundo
como se no íntimo de ti
como se
no silêncio do silêncio
sem nome
o que tu nunca saberás
respirasse
o futuro amor sempre inconcluído.

António Ramos Rosa

sexta-feira, 11 de junho de 2010

NÃO, NÃO É CANSAÇO

Não, não é cansaço...
É uma quantidade de desilusão
Que se me entranha na espécie de pensar,
E um domingo às avessas
Do sentimento,
Um feriado passado no abismo...

Não, cansaço não é...
É eu estar existindo
E também o mundo,
Com tudo aquilo que contém,
Como tudo aquilo que nele se desdobra
E afinal é a mesma coisa variada em cópias iguais.

Não. Cansaço por quê?
É uma sensação abstrata
Da vida concreta —
Qualquer coisa como um grito
Por dar,
Qualquer coisa como uma angústia
Por sofrer,
Ou por sofrer completamente,
Ou por sofrer como...
Sim, ou por sofrer como...
Isso mesmo, como...

Como quê?...
Se soubesse, não haveria em mim este falso cansaço.

(Ai, cegos que cantam na rua,
Que formidável realejo
Que é a guitarra de um, e a viola do outro, e a voz dela!)

Porque oiço, vejo.
Confesso: é cansaço!...

Álvaro de Campos

(Poema escolhido por Diana Dias)

terça-feira, 11 de maio de 2010

AS MÃOS

Com mãos se faz a paz se faz a guerra.
Com mãos tudo se faz e se desfaz.
Com mãos se faz o poema – e são de terra.
Com mãos se faz a guerra – e são a paz.

Com mãos se rasga o mar. Com mãos se lavra.
Não são de pedras estas casas mas
de mãos. E estão no fruto e na palavra
as mãos que são o canto e são as armas.

E cravam-se no Tempo como farpas
as mãos que vês nas coisas transformadas.
Folhas que vão no vento: verdes harpas.

De mãos é cada flor cada cidade.
Ninguém pode vencer estas espadas:
nas tuas mãos começa a liberdade.

Manuel Alegre

domingo, 11 de abril de 2010

PRECE

Dirijo-me a vós, meu Deus,
Porque só vós dais
O que não se obtém senão de vós

Dai-me, meu Deus, o que vos resta
Dai-me o que os outros não vos pedem
Eu não vos peço riqueza
Nem o sucesso, nem mesmo a saúde
Tudo isso, meu Deus, vos pedem abundantemente
Que vós não deveis ter mais para dispor

Dai-me, meu Deus, o que vos resta
Dai-me o que outros recusam
Eu quero a insegurança e a inquietude
Eu quero a tormenta e a batalha
E que vós me as deis, meu Deus
Definitivamente
Que eu tenha a certeza de as ter sempre
Porque não ouso ter sempre a coragem
De vo-las pedir.

Dai-me, meu Deus, o que vos resta
Dai-me o que os outros não querem
Mas dai-me também a coragem
E a força, e a fé
Porque só vós dais
O que não se obtém senão de vós.

Autor Desconhecido

(Poema escolhido e traduzido por Fernando Manuel Ramos)

quinta-feira, 11 de março de 2010

CÂNTICO NEGRO

"Vem por aqui" — dizem-me alguns com os olhos doces
Estendendo-me os braços, e seguros
De que seria bom que eu os ouvisse
Quando me dizem: "vem por aqui!"
Eu olho-os com olhos lassos,
(Há, nos olhos meus, ironias e cansaços)
E cruzo os braços,
E nunca vou por ali...
A minha glória é esta:
Criar desumanidades!
Não acompanhar ninguém.
— Que eu vivo com o mesmo sem-vontade
Com que rasguei o ventre à minha mãe
Não, não vou por aí! Só vou por onde
Me levam meus próprios passos...
Se ao que busco saber nenhum de vós responde
Por que me repetis: "vem por aqui!"?


Prefiro escorregar nos becos lamacentos,
Redemoinhar aos ventos,
Como farrapos, arrastar os pés sangrentos,
A ir por aí...
Se vim ao mundo, foi
Só para desflorar florestas virgens,
E desenhar meus próprios pés na areia inexplorada!
O mais que faço não vale nada.


Como, pois, sereis vós
Que me dareis impulsos, ferramentas e coragem
Para eu derrubar os meus obstáculos?...
Corre, nas vossas veias, sangue velho dos avós,
E vós amais o que é fácil!
Eu amo o Longe e a Miragem,
Amo os abismos, as torrentes, os desertos...


Ide! Tendes estradas,
Tendes jardins, tendes canteiros,
Tendes pátria, tendes tetos,
E tendes regras, e tratados, e filósofos, e sábios...
Eu tenho a minha Loucura !
Levanto-a, como um facho, a arder na noite escura,
E sinto espuma, e sangue, e cânticos nos lábios...
Deus e o Diabo é que guiam, mais ninguém!
Todos tiveram pai, todos tiveram mãe;
Mas eu, que nunca principio nem acabo,
Nasci do amor que há entre Deus e o Diabo.


Ah, que ninguém me dê piedosas intenções,
Ninguém me peça definições!
Ninguém me diga: "vem por aqui"!
A minha vida é um vendaval que se soltou,
É uma onda que se alevantou,
É um átomo a mais que se animou...
Não sei por onde vou,
Não sei para onde vou
Sei que não vou por aí!

José Régio

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

DEVE SER O ÚLTIMO TEMPO

Deve ser o último tempo
A chuva definitiva sobre o último animal nos pastos
O cadáver onde a aranha decide o círculo.
Deve ser o último degrau na escada de Jacob
E último sonho nele
Deve ser-lhe a última dor no quadril.
Deve ser o mendigo à minha porta
E a casa posta à venda.
Devo ser o chão que me recebe
E a árvore que me planta.
Em silêncio e devagar no escuro
Deve ser a véspera. Devo ser o sal
Voltado para trás.
Ou a pergunta na hora de partir.

Daniel Faria

(Poema escolhido por Mafalda Cabrita Neto)

segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

O QUE TE PEÇO, SENHOR...

O que te peço, Senhor, é a graça de ser.
Não te peço mapas, peço-te caminhos.
O gosto dos caminhos recomeçados,
com suas surpresas, suas mudanças, sua beleza.
Não te peço coisas para segurar,
mas que as minhas mãos vazias
se entusiasmem na construção da vida.
Não te peço que pares o tempo na minha imagem predilecta,
mas que ensines meus olhos a encarar cada tempo
como uma nova oportunidade.
Afasta de mim as palavras,
que servem apenas para evocar cansaços, desânimos, distâncias.
Que eu não pense saber já tudo acerca mim e dos outros.
Mesmo quando eu não posso ou quando não tenho,
sei que posso ser, ser simplesmente.
É isso que te peço, Senhor:
a graça de ser de novo.

José Tolentino Mendonça